Toquinho fala sobre os 30 anos sem Vinicius de Moraes
Poeta também era diplomata, dramaturgo, jornalista e compositor
Fabian Chacur e Daniel Vaughan, do R7
Nesta sexta-feira (9), faz 30 anos que Vinicius de Moraes, o maior poeta da música brasileira, morreu.
A poesia apaixonante do boêmio esquenta até hoje os corações e mentes de brasileiros de todas as idades.
Seja nas palavras lindamente escritas ou através da música encantadora feita em parceria com gênios como Tom Jobim e Baden Powell, é impossível não esbarrar na obra do artista sem ficar emocionado.
Poetinha, como era conhecido, também foi diplomata, dramaturgo, jornalista e compositor. E, acima de tudo, uma simpatia.
O cantor e compositor Toquinho conheceu Vinicius como ninguém. Ele foi amigo e parceiro musical do poeta por anos. Nesse período, a dupla compôs pérolas como Tarde em Itapoã, Como Dizia o Poeta e A Tonga da Mironga do Kabuletê. Foram cerca de 100 composições.
Para saber mais sobre o poeta, o R7 entrevistou com exclusividade Toquinho.
Veja.
R7 - Como e quando foi que você conheceu o Vinícius de Moraes? Quais são suas lembranças daquele momento?
Toquinho - Adolescente ainda, já era amigo do Chico Buarque. Às vezes ia a casa dele, em São Paulo, na rua Buri, e coincidia de o Vinicius estar lá, visitando o Sérgio, pai do Chico. Lembro-me que ficávamos espreitando de longe os dois conversando naquela biblioteca enorme, imaginando algum dia poder estar mais próximo daquele poeta incrível. Alguns anos mais, o Chico havia composto A Banda e ia mostrar para o Vinicius, no Rio de Janeiro. Ele me levou junto para que eu o acompanhasse no violão. Foi a segunda vez que estive perto dele, mas nem nos falamos. Só fui conhecê-lo concretamente quando me convidou para trabalhar com ele na Argentina, em 1970. Encontrei-o no navio que nos levaria até Buenos Aires. Passei muito mal à noite, o navio balançou muito, e Vinicius não saiu do meu lado. Aí comecei a perceber seu lado solidário e generoso. Começava, então, uma grande amizade entre nós, que redundou numa parceria tão longa e produtiva.
R7 - O que você aprendeu de mais importante com Vinícius?
Toquinho - Minha convivência com ele representa um marco em minha vida. Acho que aprendi muito com ele, não só no aspecto profissional como no pessoal também. Não há como não aprender com Vinicius. Ele me ensinou a ser mais responsável e a respeitar as pessoas. Quase tudo que sei de roteiro de show, desempenho no palco, como levar um espetáculo, aprendi com ele. Hoje me considero também um bom letrista. Certamente Vinicius tem uma forte influência nisso. Enfim, foi uma troca, eu o enchi de juventude numa fase em que ele precisava de um estímulo vigoroso para voltar a compor e exercer sua força poética e musical.
R7 - Qual a primeira música composta em parceria por vocês?
Toquinho - A primeira canção que fizemos foi Como Dizia o Poeta, uns dois meses depois da viagem a Buenos Aires. Essa foi a primeira de cerca de 100 composições.
Foto por Divulgação/Site Oficial Toquinho
Vinicius e Toquinho na casa de Sergio Bardotti (1971).
Inspiração para a canção Valsa para uma Menininha
R7 - Como você definiria o Vinícius como poeta e compositor?
Toquinho - Ele é o grande poeta brasileiro que popularizou a poesia “dos livros”, levando-a para a música. E foi muito criticado por isso, e ficava irritado quando diziam que a poesia dos livros era uma poesia maior. Pelo contrário, ele achava que tudo era poesia com o mesmo valor poético. Ele tinha um ouvido interno aprimorado que o facilitava nas composições. Tanto que ele é autor de lindas melodias. Às vezes, eu improvisando no violão, e ele ao lado, me alertando: “Toco, você acaba de perder uma melodia”. Eu repetia os acordes e saía mais uma música. Geralmente eu deixava com ele uma melodia gravada e ele colocava letra. Depois trabalhávamos nos ajustes de algumas palavras. Foram poucos os poemas que musiquei.
R7 - Dos discos que vocês gravaram juntos, qual o que mais te agrada?
Toquinho - Na primeira fase da parceria chegamos a gravar dois discos por ano, as músicas saíam diariamente, com uma qualidade impressionante. Quase todas, sucesso, até hoje cantadas nos shows. Um disco lindíssimo é aquele que gravamos na Itália, com a Ornella Vanoni. É emocionante! Outro que me agrada muito é o dos dez anos de parceria. E tem também o do show do Canecão, com a participação do Tom Jobim e da Miúcha.
R7 - Ainda existe alguma parceria de vocês inédita?
Toquinho - Recentemente veio parar em minhas mãos um poema dele que eu havia musicado e nunca mais achei. Chama-se Romeu e Julieta. Gravei no CD em homenagem a ele que deverá ser lançado ainda esse ano. É um trabalho que conta com a participação do Paulo Ricardo. São músicas de Vinicius com uma roupagem inusitada. Uma surpresa!
R7 - Relembre alguma história curiosa vivida por vocês dois juntos.
Toquinho - Certo dia, na casa dele em Salvador, ele me levou no recinto onde criava um gato, um cachorro, um peru e um pavão. E me disse: “Toco, esses bichos me ensinam mais do que aprendi em toda minha vida. Convivem numa harmonia que todo ser humano deveria conviver, apesar da diferença das espécies”. Vinicius ensinava dessa forma.
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